quarta-feira, 2 de março de 2011

Coisas das Arábias


Uma parte considerável do mundo islâmico está em conturbação. São muitos anos de ditaduras burguesas e parlamentares que apoiadas em multifacetadas falcatruas eleitorais e confortadas pelas hipocrisias internacionais, levaram ao extremo a exploração dos povos e dos seus recursos.

Os principais aliados destas oligarquias familiares, capitalistas e repressivas - a UE e os EUA -, ainda ensonados pelos proveitos traduzidos em múltiplos contratos e acordos de jaez exploradores e rentáveis, com a precipitação dos factos e o seu carácter revolucionário, temendo os sentimentos populares e formas de poder que lhes fujam ao controlo, tiveram de concertar discursos com os novos dirigentes que lhes podem garantir esse mesmo controlo da situação em continuação das suas políticas.

Durante décadas, as inanidades governamentais praticadas, as leis controversas com benefícios em escala reduzida e a repressão generalizada que garantiam bons negócios e aliados silenciosos sobre guerras e assaltos a países do mundo islâmico, mereceram sempre muita compreensão…

As virtudes ocidentais, apesar da instalada vigilância de um exército de serviços secretos, foram surpreendidas pelas revoluções democráticas burguesas que ocorreram e cujos valores não estão controlados, tal é a profundidade do descontentamento atingido.

A desorientação e os níveis de preocupações nas potências aliadas dos velhos poderes produziram um fluxo telefónico cruzado de concertação, não faltando as habituais declarações dos mais variados dirigentes que rasgam publicamente contratos e alinham rapidamente nos valores de outras formas de democracia e reformas.

No pioneiro caso da Tunísia em que o povo rejeita as soluções que lhe vão propondo, a atitude da lucidez ocidental é a de ganhar tempo, depois do ditador se ter posto a salvo com os bolsos cheios. Trata-se de um país de pouca relevância no mundo árabe e no contexto do saque.

No Egipto, um caso mais grave e de inegável importância geo-estratégica no conflito israelo-árabe e no conjunto das referências do mundo muçulmano, a situação não só não está controlada - o Supremo Tribunal decretou o impedimento da saída de Hosni Mubarack e o congelamento da sua fortuna (!?) -, o que não agradará aos seus aliados e benfeitores que lhe devem a impunidade, os desenvolvimentos não deixarão de trazer ao de cima os sentimentos de solidariedade do povo egípcio com os atropelos sofridos pelos seus irmãos palestinianos.

Na Líbia, o país do anedotário da suprema hipocrisia internacional que fechou os olhos ao atropelo da dignidade social entre povos que levou ao fechar de olhos sobre crimes de elevada gravidade, a sociedade das Nações e o seu único braço armado - a NATO -, estão nos mares a postos e não põem de parte a intervenção armada. Razões? Oficialmente, impedir uma luta fratricida entre leais do poder e o povo revoltado, advindo daí uma acção de influência de um poder que lhes seja favorável.

No fundo, o que é que está em causa nesta convulsão inconveniente e inoportuna para as teorias de superioridade e interesses do mundo ocidental? A resposta é simples: o mundo árabe não pode mudar os votos de cobertura do que se passa na Palestina, no Iraque e no Afeganistão!

As revoluções democráticas burguesas que eclodiram e aparentemente nos querem fazer acreditar que os povos apenas procuram reformas sociais e políticas, não deixarão de trazer subjacentes as injustiças teóricas e estruturais do mundo árabe e as manipulações de que têm sido alvo!

Depois dos lixos tóxicos dos mercados financeiros mundiais (e já em reorganização) terem despoletado a mais grave crise económica mundial, os lixos políticos do mundo árabe foram os primeiros a implodir, faltando saber o que o futuro reserva para os seus pares europeus mais expostos na proximidade, na cumplicidade e na profundidade das más políticas, internas e externas, sabendo que a América - conservadora e oportunista -, afina por uma consciência consumista e de bastião de resistência às transformações.

O mundo árabe já começou as perguntas… os outros terão medo de as fazer?


Luis Alexandre

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